Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) apresentaram nesta
segunda-feira (15) uma tecnologia de “rearranjo” na fórmula do cimento
tradicional que promete diminuir em até 50% a emissão de dióxido de
carbono (CO2) na produção.
A ideia é reduzir a matéria-prima do cimento chamada clínquer e
aumentar o uso de outro tipo de ingrediente, conhecido como filler, que,
ao contrário do primeiro, não precisa passar por aquecimento em forno
para ser produzido. No caso do estudo, foi usado como filler o pó de
calcário cru superfino.
Hoje de 90% a 95% da emissão de CO2 na obtenção do cimento se origina
na produção do clínquer, mistura de argila e calcário cozida em um
forno a 1,4 mil ºC, afirmam os cientistas. Deste cozimento resulta um
material granulado (o clínquer), que é moído com um pequeno percentual
da matéria-prima do gesso para a fabricação do cimento tradicional.
Além de emitir dióxido de carbono (610 kg para cada tonelada de
cimento produzido, no caso do Brasil), o processo de obtenção do
clínquer é responsável por mais de 80% do consumo de energia na produção
do cimento, apontam os cientistas.
Os pesquisadores citam como exemplo uma produção de cimento que
utilize, em sua fórmula, 800 kg de clínquer. A ideia seria reduzir a
substância para cerca de 300 kg na fórmula e levar o filler, que hoje é
de 6% a 10% do cimento tradicional, a ser até 700 kg do produto final.
“É uma matéria-prima mais simples, que exige estrutura menor da
indústria e dispensa o uso de forno em uma das etapas de produção”,
afirma o professor Vanderley John, professor da Escola Politécnica da
USP e um dos autores do estudo. A análise contou com uma equipe de 20
pesquisadores.
Aumento da demanda – “Os países dependem do cimento
para melhorar a infraestrutura, fazer obras, obter concreto”, afirma
John. A previsão é que a demanda por cimento vá mais do que dobrar até
2050 em todo o mundo, em comparação com os índices atuais. Com a adoção
da nova tecnologia, seria possível suprir a necessidade global sem
elevar as emissões de CO2 pela indústria cimenteira, ressalta o
professor da USP.
“A estimativa é que hoje a produção do cimento responda por 5% do
total de dióxido de carbono emitido na atmosfera”, diz o professor. “Sem
inovações, estudos mostram que no futuro o setor poderá ser responsável
por cerca de 20% do total de CO2″. A nova tecnologia pode permitir que
estas emissões sejam controladas, na avaliação de John.
Na prática, o que os pesquisadores propõem é que o pó de calcário cru
seja usado para fazer o cimento “render”, permitindo uma capacidade de
produção mundial até duas vezes maior, com menos clínquer, e sem
aumentar a quantidade de dióxido de carbono emitido.
Moer – Para a nova fórmula dar certo, é preciso que o
calcário cru (ou outro filler inerte utilizado) seja moído em porções
muito finas, “mais até do que talco”, e que passe por um processo
rigoroso de tratamento e controle de qualidade, avalia o professor de
engenharia Rafael Pileggi, também da USP.
“Já existe a tecnologia para moer nestas condições, mas ela não é
aplicada na indústria cimenteira”, pondera Pileggi. Segundo ele,
processos de moagem semelhantes são usados na indústria farmacêutica, na
cosmética e outras.
Um dos desafios é convencer a indústria cimenteira a produzir e
adotar o filler em larga escala, além de dispensar o uso do forno em uma
das etapas de produção. Segundo os pesquisadores, a ideia é substituir o
uso do forno – que é movido a combustível fóssil e também emite
poluentes para além da reação química de formação do clínquer – por uma
tecnologia semelhante à de moinhos, porém mais eficiente.
Para não elevar muito o custo para a indústria, a ideia foi utilizar
os mesmos elementos que hoje formam o cimento, ressalta Pileggi. “A
estratégia tem como vantagens diminuir o consumo de energia”, o que deve
contribuir também para que o preço do produto para o consumidor final
não suba.
“Tomando como base apenas o cimento brasileiro, a tecnologia da Poli
poderia fazer cair a emissão para cerca de 360 kg de CO2 por tonelada de
cimento, ou seja, 40% a menos”, diz John. Ele ressalta que os
resultados foram obtidos em laboratório, mas que há empresas
interessadas em conhecer e testar a nova tecnologia.
Para o resultado ser positivo, os pesquisadores ressaltam que é
preciso racionalizar a produção – melhorar também o uso do clínquer, de
aditivos, do combustível no forno, do transporte do cimento e outros
fatores.
(Fonte: G1)
Nenhum comentário:
Postar um comentário